quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

De Lenin a Churchill - Moscou, Rússia (5º dia)

   No ônibus, puseram uns DVDs. Até aí, nada de mais. Eram dublados em russo ( tudo ok - eu deveria ser o único brasileiro ). O interessante era a forma da dublagem. No primeiro filme, a dublagem era com um cara lendo todas as falas masculinas e uma mulher lendo todas as falas femininas e infantis. No segundo filme, um único cara, sempre com a mesma intonação, lia todas as falas. E, em ambos, se podia ouvir o som original no fundo. Dormi mais um pouco.
   O ônibus parou. Acordei. Estava com um cobertor. A ajudante deve ter me coberto. Gostei dela. Estavamos na alfândega da Letônia com a Rússia. Estava com um pouco de receio. Não sei se estão acostumados a receber brasileiros. Até onde sei, eles não comem criancinhas, mas sei lá, né? hahaha
Alfândega Rússia-Letônia
   O guarda pediu o documento. Ele me fez umas perguntas ou comentários, que obviamente não entendi, mas achei ele legal, pelas expressões dele. Bem melhor do que a mulher da embaixada. De cara, na primeira pergunta, perguntei se ele falava inglês. Ele respondeu que só um pouco. Tentei falar com ele, mas quando eles dizem um pouco, quer dizer que não falam absolutamente nada. Depois, viu os carimbos do meu passaporte, fez uma cara como quem diz "puxa !!!" e fez outra pergunta em russo. Achei que ele comentou que eu viajava muito, mas como não tinha certeza, disse que não entendia o que dizia. Ele me fez um gesto pra eu deixar pra lá. Com os passaportes de todos os passageiros, ele foi pra cabine. Mais tarde, já na estrada, vi a ajudante com o motorista conversarem e ouvi ela dizer palavras que pareciam com Brasil e turismo. Fiquei achando que tive uma ajuda dela com o guarda.
Moscou: Engarrafada como toda cidade grande
   Depois, veio a parte de conferir as malas. Saimos todos do ônibus e, cada um com a sua mala, nos dividimos em duas filas para as duas máquinas. Estava frio. Ninguém conversava. Eles não falavam inglês e qualquer pergunta que fizessem, não teríamos como nos entender. Fiquei com um certo receio por isso. Na hora de olhar o passaporte, a mulher, sem falar uma palavra, foi falar com o colega no outro guichê. Demorou, olhou no computador, mas depois, liberou.
   Fizemos um fila única para voltar pro ônibus. Enquanto esperava, aproveitei pra trocar dinheiro. Não trocavam dinheiro lituano. Tive que apelar pros euros que carregava.
Prospekt Mira - Avenida Paz
   Logo após a alfândega, o ônibus parou em uma loja de conveniência. A atendente era linda garota com um vestido que mais parecia apropriado pra dançar em uma festa de 15 anos. Peguei uns biscoitos e uma água e fui pagar. Pra ser prático, dei uma nota de 100 rublos. Não tinha erro, pensei, era só pegar o troco. A garota começou a repetir: disciat. E eu não entendia e ela repetia a mesma palavra com mais ênfase. Eu já era o único passageiro ainda na loja. Imaginei que ela queria dinheiro pra me dar um troco mais arredondado. Estava certo. Mostrei o dinheiro e ela pegou a nota de 10 rublos... Ok... melhor is me preparando... Voltei pro ônibus. Comi meu lanche, me cobri e voltei a dormir.
   Chegando em Moscou, não acreditava que estava lá. A mãe Rússia, como diziam, era real e eu pisava nela. O local onde o ônibus parou não era uma rodoviária, mais parecia um ponto na rua. Nos deixou e seguiu. Antes dele ir, tive tempo de perguntar pra atendente como se pegava o metrô. Ela me indicou, sempre sorridente.
Metrô de Moscou - fique na direita
   Naquele momento, só sabia que "tri" era três. Era o número mais fácil pra aprender e, como iria viajar bastante, comprei um bilhete para três viagens. Fiquei na longa escada rolante procurando olhando nas placas, quando me dei conta de que tinha alguém atrás de mim. Não me cutucou, não pediu licença. Aí percebi: quem quer esperar na escada, fica a direita e deixa a esquerda para quem quer passar apressado. Mas, apesar de apressados, eles respeitam o desajeitado que ficar na esquerda. Imagina uma multidão, na saída do trem se apertando pra ficar a direita. É exatamente assim e sem nenhuma placa dizendo como se comportar.
   Para saltar, sai na estação certa, mas fui pela saída errada. Perguntei pra uma senhora como chegar na rua do albergue. Eu tentava falar as palavras, mas eles nunca entendiam. Parece uma falha típica de intonação de quem não conhece o idioma. Mostrei o papel com o nome da rua. Ela chamou um policial. Ele indicou. Essa foi a primeira pergunta que fiz pra um policial de lá.
Na terra do maior McDonalds do mundo
   Tive outros contatos com eles e em todos fui tratado decentemente. No entanto, dizem em outros sites ou blogs e pelo próprio cara do albergue one fiquei pra sempre evitar eles. No albergue, inclusive, me disseram que tive sorte. Mas, apesar de tudo, não tenho mais medo deles do que tenho de um policial carioca. Se a pessoa me parecer decente, vou acreditar. Sei que existem os corruptos, mas em Moscou, pelo menos, não vi perigo nesse ponto. Ao menos, não em locais turísticos, nem mesmo no metrô, como nas estações em que tinham tido, pouco tempo antes, problema de terrorismo. Não era violência urbana, mas problemas internos.  Problemas internos todo pais tem o seu. Não tinha nada a ver comigo.
   Antes, fui almoçar. Realmente, estou forçando a barra todos esses dias. Não costumo comer de manhã e quando é de manhã pro meu físico, é hora de almoçar. Foi difícil. De qualquer forma, fui pra um restaurante chamado MyMy (leia-se Mu Mu, como faz uma vaca). Comida simples, apesar da carne processada, mas boa. é tipo um comida a quilo, mas os preços são diferentes para cada tipo de prato. Destaque para a sopa de legumes, que comi de entrada, misturada com cimetama (um tipo de creme de leite, mas diferente do que temos aqui)
Em frente ao prédio da Real Russia
   Fiz um primeiro passeio: Fui pegar a minha passagem de trem que tinha comprado pela internet, na tal da Real Russia. Saltei na estação e tentei achar o local. Sai da avenida principal e fui parar em um conjunto de prédios, aparentemente residenciais.
   Pedi ajuda pra primeira pessoa que apareceu: Uma menina de uns 11 anos, muito bonitinha, com cara de russa. Abriu um sorriso quando perguntei se falava inglês e isto seria a única reação como esta em toda a minha visita. A reação mais comum quando perguntei se falavam inglês, era tapar o rosto e dizer: "no english". No entanto, ao se ouvir pajausta (licença) automaticamente prestavam atenção. A menina falava inglês até bem, mas não conhecia a rua. Ela me ajudou a procurar. Perguntou pra outros que apareceram depois. Ninguém sabia. Olhando as placas, achamos a rua, mas a numeração parecia toda complicada e eu continuava só vendo prédios de apartamentos. Me despedi dela. Continua a procura.
   As ruas voltaram a ficar vazias. A frente, vi o símbolo de uma Igreja Universal do Reino de Deus. Pensei comigo que, com certeza, tinham brasileiros. Pensei em entrar. Vi que umas pessoas me olhavam com ar de desconfiança. Titubeei e pensei melhor. Não queria um pastor tentando me converter. Iria me fazer perder tempo e me irritar, como aconteceu em Porto Alegre, em uma que tinha próximo a rodoviária de lá. Olhei melhor e vi um senhor. Tentei perguntar sobre o endereço, mostrando o papel. Ele fez que não sabia. Mais a frente, surgiu um cara que parecia asiático, mas que provavelmente era descendente de alguma ex-república soviética. Perguntei pra ele com o mesmo papel. Ele também não falava inglês, mas foi muito prestativo. Pegou o celular, um iPhone, e, com o GPS, achamos o lugar. Ele ia na frente, olhando o telefone, e dizia "come, come" (vir em inglês e não pra comer... hahaha), fazendo um gesto com a mão para que eu o seguisse.
   O cara que tinha me ajudado tentou pedir pro guarda, com cara de russo, pra me acompanhar até o escritório, mas ele não deixou. Na pressa, acabei não pegando um contato.
   No escritório da Real Russia, fui bem atendido. Me deram rapidamente o envelope com os bilhetes. O curioso era que também não falavam inglês lá. Pra pedir um copo d'água, tive que apelar novamente pro meu quase inexistente conhecimento de russo. Pedi por vadá e me apontaram o bebedouro.
Monumento aos Conquistadores do Espaço
   Depois disso, resolvi voltar andando pro albergue e ir conhecendo a cidade. Por "sorte", decidir ir pelo lado errado ( só descobri horas depois ) e acabei encontrando uma praça com um monumento aos conquistadores do espaço, os cosmonautas. Merecido por sinal. Uma estrela com a descrição de cada conquista, sendo que as últimas três estrelas esperando as futuras; tinha uma representação do sistema solar e a frente do grande monumento, em forma de um lançamento de um foguete, uma estátua de Konstantin Tsiolkovsky, um dos pais da astronáutica.
Yuri Gagarin
    Este monumento é, na verdade, um museu dedicado a aeronáutica e tem, inclusive, as figuras dos cachorros empalhados que foram nas missões. Infelizmente não consegui visitar. Já estava fechado. Do lado de fora, havia um painel em auto relevo resumindo toda a conquista espacial russa e ao lado, enfileirados, os bustos dos pioneiros. O único que tinha flores era o de Gagarin. Talvez, por ter sido o primeiro, mereça um status maior.
VDNKh: Pavilhão principal com Lenin

   Não há nada melhor do que encontrar sem querer um lugar legal. Dá uma sensação de descoberta, como se estivesse desbravando algo.
   Mas quando pensei que tinha visto tudo o que aquela região me oferecia, vi ao longe um portal e estava entrando no parque VDNKh. Um lugar incrível.
VDNKh: fonte
   Imagine um lugar cheio de familias se divertindo ( vi até alguns turistas chineses), mas com um detalhe: cheio de prédios da antiga União Soviética. Inclusive uma grande estátua de Lenin. A cada passo, a descoberta de um novo pavilhão, de uma fonte nova. Ver pessoas. Essa foi a melhor coisa desse lugar.
A pilha da minha máquina  acabou. Comecei a procurar algum lugar. para comprar. Dei uma olhada no meu dicionário e, em uma barraquinha, pedi pela pilha. O vendedor tentou puxar conversa, perguntando da onde eu era. Infelizmente, ainda não sei falar russo...
   O parque é realmente enorme. Não daria tempo de entrar em um por um dos pavilhões e ver as pessoas era realmente agradável. Fiquei por ali mesmo no meio de pavilhões, cartazes de propaganda e uma incessante fala em um único tom, propaganda de algo que não faço ideia do que era, mas que pela forma de dizer mais parecia me sentir que o Big Brother realmente falava ao povo (leia ou veja 1984).
Pavilhão Espacial
   Seria curioso se os velhos do antigo partido comunistas, pudessem entrar em uma máquina do tempo e ver os seus belos e majestosos pavilhões, símbolos de um passado recente,  rejeitado por muitos dos jovens e ainda saudoso para vários dos antigos, e vissem propagandas de rádios e de ótica. Na entrada,  tinha até mesmo uma propaganda de um show do Iron Maiden (nesse eu realmente queria ter ido: um show da dama de ferro na ex-cortina de ferro).

   Assim como em Vilnius, vi gente cantando nas ruas, pedindo dinheiro. Cantam musicas folclóricas e até bem. Falando em Vilnius, vi senhoras esperando por dinheiro nas ruas na porta das igrejas. Lá também, no meu último dia, um cara me abordou implorando por dinheiro. Era russo. Disse que os lituanos não dão emprego pra ele e os turistas estranham por ele ser um cara grande que poderia trabalhar. Ele tinha uma ferida enorme na perna que disse ser por má circulação. Bom, situação inversa a do garoto que me ajudou com o vigia russo. Ex-soviéticos odeiam os russos. Russos odeiam ex-soviéticos. Toda cidade que vira referência sofre do mesmo mal. O problema é que nunca se tem emprego para todos e alguns vão para o crime. Agora, para muitos russos, as pessoas das ex-repúblicas soviéticas são sinonimo de pessoas problemáticas, mas na realidade são eles quem limpam as ruas e atendem nas lojas e restaurantes. Triste, porém real...
   E agora? como voltar ao metrô? Tentei de novo ver se falavam inglês. Nada... Pergunta clássica: Gdie metrô? (Onde fica o metrô?) e tentar imaginar a resposta. Que bom que russos também respondem gesticulando como nós... hahaha
   Na ida ao ticket do trem, reparei no olhar desconfiado de um senhor no metro. Uns 60 anos. Procurei não prestar muita atenção.
Quem disse que bonde é coisa do passado?
   Já dentro do metrô, outro senhor fez o mesmo olhar. Procurei reparar nas outras pessoas. Conversavam, jogavam nos seus celulares, telefonavam para os amigos, cuidavam de suas vidas. Só aquele ex-camarada insistia em olhar como se dissesse: o que faz aqui? quem é você? Um triste olhar soviético cansado.
   Somente em algum momento da viagem, percebi que o olhar dele mudou. Resolvi olhar o motivo. Ele olhava uma mulher no vagao. Pelo menos, eu sei que alguma coisa ainda bate no velho coração soviético: A velha vontade, como todo homem, por uma mulher. Somos todos humanos afinal. Tomara que percebam logo isso...
   A noite fomos, com uns ingleses do albergue, comprar umas cervejas no mercado. Cada um pegou uma lata de um litro e voltamos beber no albergue. Depois, atravessamos a rua e fomos num lugar. Na porta,  pequena, carrões com motoristas esperando. Estava quase vazio. Só um grupo de homens bem vestidos que conversava. Uma linda atendente, também bem vestida, nos levou a nossa mesa. Tomamos só uma cerveja e pagamos caro por ela. O ambiente me fez sentir como num filme de espionagem. Depois nos contaram que um jantar naquele lugar poderia custar uns 1000 dólares. Enormes diferenças de classes sociais: parece ser assim a vida em Moscou...

Um comentário:

Anônimo disse...

Ok!

tah funcionando!

sds Leo

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